segunda-feira, 31 de agosto de 2009

A Liberdade e o Cinema

Venho hoje dar-vos, minhas queridas sardinhas em escabeche, duas boas razões para irem ao cinema.
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Up

Estou por tudo. Enquanto a Disney cai aos bocados desde a Mulan, (com a pequena excepção, um canto do cisne invulgar: Pacha e o Imperador que é o filme da Disney menos Disney de sempre), a Pixar parece estar a fazer o caminho inverso. Começaram com filmes giros mas fraquinhos e depois veio À Procura de Nemo, seguido de Ratatouille e WALL-E. Up é o seguinte e não me desapontou em nada.
A montagem inicial é algo para ser visto. Consegue contar em poucas imagens uma história inteira. Desde momentos hilariantes, a enternecedores passando por outros terríveis e um final muito triste.
Depois a história desenvolve-se toda à volta de uma metáfora do tamanho de uma casa. Literalmente. Primeiro simbolizando a liberdade, depois simbolizando as memórias. Acaba por apenas simbolizar a vida.
Só o conceito de pôr uma casa a voar por meio de balões de hélio é de sonho. Desde criança que eu queria ver um filme sobre uma coisa como isto.
As personagens são espectaculares: o velho rabugento, a criança enérgica e bastante faladora, a versão golden retriever do Rantanplan e o "gambozino". Receberam um tratamento muito diferente ao habitual tratamento da Pixar, que arranja maneira de transformar um objecto inanimado a uma coisa quase antropomorfica (WALL-E e Steve McQueen são os exemplos mais gritantes). Pelo contrário. Tal como aconteceu em Madagascar, embora elevando-o ao nível seguinte, trabalhou na geometrização das personagens, como caricaturas. Carl é um amontoado de quadrados, Russel é uma bolinha, Muntz são quase finas linhas sinuosas, a fazer um ligeiro "S". Esta caricaturização fnciona? Funciona, pois.
Christopher Plummer, como o grande actor que é e o estreante Jordan Nagai, por um olhão do realizador Peter Docter, dão as duas melhores performances vocais do filme.
Não chega à maravilha de poesia que é WALL-E, mas é um sucessor digno dele. Merece um 9.

PS: Será que fui só eu e mais um par de malucos pelos filmes que reparou que o Carl Fredricksen era uma caricatura do Spencer Tracy em velho?




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Iglourious Basterds


Devo confessar que nunca fui um fã de Tarantino nem segui a sua carreira desde o início até agora. O que eu conheço dele, resume-se ao episódio de CSI, o seu primeiro filme, Reservoir Dogs e uma curta da antologia Quatro Quartos, que realizou em conjunto com Robert Rodriguez e mais uns dois realizadores ainda desconhecidos.
Há que reconhecer. Tarantino é um mestre dos diálogos, o último desde Woody Allen, apesar destes dois terem um espectro muito diferente um do outro.
A primeira cena, um diálogo quase monólogo em duas línguas entre o coronel nazi Hans Landa e o lavrador Mr. LaPadite, que abriga uma família judia em sua casa, é a cena mais icónica do filme. E merece-o. Palavra por palavra, Landa vai destruíndo todas as defesas do lavrador até o desmascarar e matar os judeus que estão escondidos por debaixo do soalho. Não estaria a mentir se dissesse que esta cena entraria para a história do cinema como a perseguição no escuro d'O Silêncio dos Inocentes.
Christopher Waltz recebeu, provavelmente, um dos melhores papéis dos últimos tempos, e atirou-se a ele com unhas e dentes. Mereceu, sem dúvida, o seu prémio de Melhor Actor em Cannes. E valer-lhe-á uma nomeação para os Óscares, sem a menor das dúvidas.
Brad Pitt, por sua vez, coleccionando mais um papel diferente de todos os outros que já fez (assassino, idiota, vampiro, polícia novato, ladrão, pirata, Anjo da Morte e vendedor de sabão hiper-violento, só para citar alguns), como um selvagem Tenente do Tenessee que escalpela as suas vítimas. Esta será, sem dúvida, uma personagem tão aterradora e tão cómica, ao mesmo tempo, como grande parte das mais famosas personagens tarantinescas. Brad Pitt, que tem um timing cómico bastante bem treinado e não deixa escapar a personagem.
Tive pena de não poder ver mais da Diane Kruger, que estava a trabalhar tão bem quando a personagem dela é morta sem dó nem piedade.
Eli Roth, de certa forma, se bem que não com tanto savoir-faire, faz lembrar o seu homónimo Tim Roth, sobretudo durante a cena em que se tem de disfarçar de italiano.
Mélanie Laurent, por sua vez, pode por-se ao lado de Christopher Waltz. Eles os dois roubam o filme. Pode-se dizer que ela e Waltz são as personagens principais do filme, pois toda a história gravita à sua volta. E Mélanie, até agora, uma desconhecida fora do cinema francês, entra estrondosamente no cinema americano, a grande catapulta da fama. Esperemos que não seja outra Audrey Tatou, que por mais de uma vez demonstrou ser um cavalo de um só truque.
Finalmente queria deixar uma nota: Será que é mesmo Tarantino que se coloca no papel de Aldo Raine e fecha o filme com as palavras: "Sabes, Utivich? Eu acho que esta bem pode ser a minha obra-prima."? A mim parece-me que sim.
Eu dou-lhe um 9.

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